Psicoterapias Psicodinâmicas Breves Uma Evolução
Desde Freud, a preocupação com a qualidade e extensão dos tratamentos psicológicos vem sendo alvo de estudos e pesquisas. O próprio Freud foi um pioneiro e questionador de suas próprias premissas e achados: um grande pensador e cientista.
A psicanálise como tratamento está focada na resolução de um conflito intrapsíquico pelas vias da interpretação e elaboração, caminhos que conduzem ao insight e à possibilidade de mudança.
Oriundas dos princípios psicanalíticos, porém sem determinadas regras técnicas paradigmáticas desta abordagem, as chamadas psicoterapias psicodinâmicas ganharam atenção quando a psicanálise passou a ser requisitada em diferentes contextos e atravessou momentos onde a técnica que a operacionalizava necessitou ser trabalhada em seu alcance e adequação.
Historicamente, com as guerras e conseqüente aumento do número de pessoas em sofrimento, os tratamentos de longa duração tornaram-se inviáveis às exigências da situação do momento. Eram então bem vindas as abordagens que, a partir da psicanálise, apresentassem a operacionalização de seus conceitos de forma diferenciada, sendo capazes de atender situações específicas, num menor espaço de tempo – acesso ao movimento psicodinâmico profundo, promoção de insights e mudança de comportamento num curto prazo.
O termo “breve” surge só em 1940, num trabalho de Alexander e French intitulado “Métodos mais breves de psicoterapia”, quando estes dois psiquiatras e psicanalistas norte americanos trabalhavam ativamente neste movimento. Utilizaram o termo numa oposição clara à longa duração dos tratamentos psicanalíticos.
Adiante, com as exigências mercadológicas dos planos de saúde, a filha da amarga necessidade prática” (Fenichel,1954) – referindo-se às psicoterapias breves – toma um grande fôlego e desdobra-se em diferentes e interessantes formas de trabalho terapêutico.
Isso também coincide com o aumento da comunidade de terapeutas que pode apresentar seus trabalhos com bons resultados.
Desta forma, as psicoterapias psicodinâmicas e as psicoterapias psicodinâmicas breves orientam-se:
– pelas mesmas premissas de que o sujeito vive movido por um inconsciente atuante e com os efeitos resultantes de padrões de funcionamento que incluem sentimentos, pensamentos e comportamentos;
– pelo mesmo princípio de que esta construção se faz a partir das experiências desenvolvimentais e interacionais do sujeito com ele mesmo, com os outros e com o meio;
– pela mesma idéia de que o conflito intrapsíquico se instaura e requer soluções quando a dinâmica da experiência da subjetividade se configura de forma a impedir o crescimento e a expansão do sujeito.
Numa proposta tão interessante, experimentação e criatividade ganham espaço. Teoria e técnica fazem uma interlocução fértil onde os limites de cada uma tomam novos formatos e propriedades. A operacionalização da teoria reflete uma fenomenologia que é rica fonte de informação que, por sua vez, vem impactar a teoria com novas perspectivas e desafios aos seus pressupostos. As marcas dessa interlocução são dínamos geradores de transformações que abrem novos diálogos num movimento contínuo de desdobramentos.
Clínicos brilhantes e ousados, sensíveis e profundos em seus argumentos como Sandór Férenczi (1918/1920, técnica ativa), Alexander e French (1942/1946, experiência emocional corretiva), Balint (1935/1967, conceito de foco e o poder da relação médico-paciente), David Malan (1963/1976, uso do Princípio Universal da Psicodinâmica), Habib Davanloo (1970/1990, a experiência visceral das emoções) e Michael Alpert (1992/1996, uso maciço da empatia), são alguns dos que participam dessa jornada onde os componentes dinâmico e experiencial se aliam.
A partir da pergunta como conduzir um tratamento com ambições psicanalíticas para atender às patologias contemporâneas? E com a evolução do próprio pensamento psicanalítico, descortinam-se horizontes antes não vislumbrados e o campo da fenomenologia volta a chamar a atenção para o que acontece no momento da atividade e experiência terapêuticas.
Hoje, com o progresso da tecnologia do videotape de sessões clínicas, esta fenomenologia e experiência terapêuticas se tornam evidentes, disponibilizando insumos para o aprofundamento e a criação de novas formas de se fazer um trabalho que não só acolha o insight e a interpretação, mas vá além destes: incluir o corpo, a experiência das emoções e seus correlatos fisiológicos e focaliza no momento-a-momento do encontro da díade terapeuta-paciente.
À luz de todo o conhecimento contemporâneo acerca do cérebro – órgão de sustentação da mente – percebemos que há muito mais energia e movimento envolvidos nos processos psicodinâmicos do que supúnhamos. E isso, Freud já intuía. Há muito mais acontecendo além da narrativa de uma história. A riqueza está na forma como contamos as nossas histórias vividas. Estas falam muito mais do que seu relato.
Somos o resultado da organização dinâmica da experiência somática da nossa própria história. Para atingir a aceleração do tratamento a AEDP vai trazer sua atenção para o que é visceral e somaticamente baseado no corpo.
Os padrões aprendidos nas relações precoces que se repetem na vida e, em especial na relação transferencial, vêm carregados de experiências emocionais traumáticas vividas em “estados insuportáveis de solidão” (Fosha, 2000). Em decorrência, apontam para a necessidade do suporte relacional do terapeuta.
Neste contexto, a relação terapêutica de base segura torna-se fundamental como via de ativação do potencial de saúde, naturalmente disposto em todo ser humano. E será privilegiada como o espaço onde os processos transformacionais terão lugar.
E mais, estando ancorada
– no acesso à experiência afetiva profunda,
– na relação diádica de base segura com um terapeuta emocionalmente engajado,
– com atenção às respostas às intervenções técnicas e à fenomenologia momento-a-momento do aqui-e-agora.
A AEDP reforça a conexão terapeuta-paciente com o objetivo de proporcionar ao paciente, o mais rapidamente possível, uma experiência afetivo-relacional diferenciada. As barreiras defensivas, em conseqüência dessa experiência, não necessitam ser erigidas de forma a prejudicar as possibilidades do paciente de utilizar outras, mais adequadas, a seu favor. E a qualidade afetiva dessa relação é catalisadora de fenômenos de transformação realmente poderosos que podem acelerar o processo terapêutico. Daí a utilização do termo “acelerada”(Fosha, 2000), em sua denominação.
Esclareça-se que esta modalidade psicoterapêutica não tem a preocupação com a brevidade do tratamento e sim com o seu processo que pode trazer a possibilidade de abreviar o tempo de trabalho.
O que então realmente caracteriza e faz da AEDP uma modalidade particular dentro das psicoterapias psicodinâmicas é o seu intenso olhar e crença nos aspectos saudáveis do sujeito. Além de olhar para as defesas, para as histórias traumáticas e rupturas, a/o terapeuta AEDP centra sua atenção nos caminhos nos quais as pessoas estão motivadas a correrem os riscos de entrar em contato com as experiências dolorosas e ultrapassá-las, cicatrizando suas feridas emocionais e seguindo adiante, segundo Fosha 2011.
Portanto, a Psicoterapia Dinâmica Experiencial Acelerada (Accelerated Experiential Dynamic Psychotherapy) tem suas raízes nesses dois grandes domínios: as tradições psicodinâmicas e as experienciais, e faz deles a sua base para novos avanços e expansão.